UMA ESTRATÉGIA NACIONAL PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: O MANEJO SUSTENTÁVEL

*matéria escrita por Cláudio Gonçalves dos Santos e Sergio Volk

O funcionamento da economia com o modo de produção atual, envolve a extração de recursos da natureza, na forma de matéria-prima e energia, que passam por processo de transformação e são utilizadas em diversos bens, que são consumidos pela sociedade. A sociedade por sua vez, devolve para o meio ambiente dejetos na forma de lixo. Parte do lixo pode ser neutralizada pelo meio ambiente pelos mecanismos próprios de cada ecossistema, uma parte volta para a cadeia produtiva través da reciclagem, outra parte vira energia através da queima de resíduos orgânicos e agrícolas (biomassa do lixo) e por fim o que não é reciclado, fica na natureza, poluindo o meio ambiente.

O modo de produção das economias gera dois problemas para o planeta: (i) resíduos que poluem o meio ambiente e (i) poluição atmosférica através da emissão de gases, tema deste artigo.

1.Contexto histórico

Durante a maior parte da história, a relação humana com o meio ambiente foi amistosa, obedecendo à capacidade da natureza de absorver os dejetos/resíduos gerados pela atividade humana. O avanço do processo de desenvolvimento econômico, iniciado de forma acelerada e crescente com a Primeira Revolução Industrial (1760-1850) na Inglaterra, resultou em mudanças profundas no processo produtivo, trazendo consigo alterações no padrão de vida da população, diminuição das distancias com o advento da locomotiva a vapor, empregos nas novas  fábricas de tecelagem com a produção em escala, novos produtos e maior renda disponível para a população destinar ao consumo dos novos produtos. Na época não houve preocupação com os custos do crescimento a longo prazo para o meio ambiente e o planeta. 

A Segunda Revolução Industrial (1850-1870) e a Terceira Revolução iniciada em 1950 após a segunda Guerra Mundial, apresentam seus custos ambientais sobre nossa geração. Têm causado desequilíbrios substanciais e crescentes em termos ambientais por todo o mundo. O clima extremo vai de chuvas e tempestades torrenciais em locais que não conheciam tais fenômenos, a estiagem, seca e queimadas que dizimam ecossistemas inteiros. Como resultado, o funcionamento de várias economias passa por fenômenos inflacionários, causados por mudanças climáticas que afetam a oferta de alimentos, provocando aumento nos preços. O bem-estar conquistado pela humanidade corre sério perigo.

Iniciativas vem sendo tomadas por vários países. Tem-se observado que na maioria dos países do primeiro mundo, que a agenda do desenvolvimento econômico converge com a agenda ambiental.

2.Mecanismos de controle da emissão de gases

A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, realizada no Rio de Janeiro em 1992, de junho de 3 a 14 de junho de 1992, contou com representantes de 179 países, Chefes de Estado, Organizações Não Governamentais, Representantes da sociedade civil, acompanhada por centena de jornalistas de todo o mundo, tinha como principal objetivo, “encontrar um consenso sobre como conciliar desenvolvimento socioeconômico com a proteção do meio ambiente”,consagrou o conceito de desenvolvimento sustentável e discutiu um modelo de crescimento econômico aderente ao conceito de equilíbrio ambiental.

Nasceu o conceito baseado na Internalização das Externalidades Ambientais, que significa, incorporar os cursos e benefícios ambientais das atividades econômicas no preço de mercado dos produtos, de forma que as decisões de produção e consumo, reflitam o impacto total sobre o meio ambiente. Portanto os agentes econômicos terão a responsabilidade dos impactos ambientais que suas atividades geram.

Após a Rio-92, foi dado início às COPs (Conferências das Partes), Conferências das Nações Unidas sobre Mudança no Clima, sendo a primeira realizada em Berlim, Alemanha em 1995 e a última em 2024, COP-29, realizada em Baku, Azerbaijão. Passados 29 anos de COPs, alguns avanços importantes foram dados na criação de regras para minimizar as emissões de gases, resultados da atividade humana.

Em 1997, no Japão, foi firmado o “Protocolo de Kyoto” e em 2015 na França, o “Acordo de Paris”. O primeiro estabeleceu regras com metas para redução das emissões de gases causadores do efeito estufa (dióxido de carbono “CO2”, metano “CH4”, óxido nitroso “N2O” e ozônio “O3”), criando os “Certificados de Crédito de Carbono”. Os Certificados são utilizados para compensar emissões de gases na atmosfera, que tenham como origem da emissão, empresas, governos ou indivíduos que desejam reduzir o impacto ambiental que causam com tais emissões. O segundo, estabeleceu limitar o aumento da temperatura global a 1,5 ºC em relação aos níveis pré-industriais, para isso, os governos precisam incentivas suas economias a diminuir a emissão de gases causadores do aquecimento (efeito estufa).

Considerando as regras estabelecidas no Tratado de Kyoto, a B3 (Bolsa de Valores do Brasil) lançou em dezembro de 2023, uma plataforma para negociação de créditos de carbono, em parceria com a ACX (AirCarbon Exchange). Essa plataforma, que está em operação, permite que empresas, desenvolvedores de projetos de carbono e investidores negociem créditos de carbono, contribuindo com a redução de gases na atmosfera.

Em 2025 O Brasil sediará a COP-30, na cidade de Belém, PA, no período de 10 a 21 de novembro de 2025. Será um momento importante para o Brasil apresentar ao mundo suas iniciativas para redução da emissão de gases causadores do efeito estufa, bem como os impactos ambientais provocados pela cadeia produtiva do Agronegócio e de outros setores.

De acordo com dados do IEMA – Instituto de Energia e Meio Ambiente, o Brasil emite anualmente em torno de 2,3 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa (CO2). O desmatamento contribui com 55,0%, a pecuária com 25,0%, automóveis, caminhões e outros veículos terrestres com 10,0% e outros setores com 10%.

A poluição atmosférica com o dióxido de carbono (CO2) provoca dificuldades respiratórias, gripes, amigdalites, faringites, otites, sinusites e agrava doenças instaladas, como pneumonias e tuberculose.

No Brasil, acordo com o World Resources Brasil, 50 mil pessoas morrem por ano por causa de doenças respiratórias, causadas pela poluição atmosférica. Os gastos do sistema de saúde e perdas de produtividade somam US$ 15 bilhões/ano, equivale a 0,75% do PIB/2024.

3.Manejo sustentável – uma contribuição para o meio ambiente

O conceito de manejo sustentável surgiu em Estocolmo, na Primeira Conferência das Nações sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1972, onde o conceito de “ecodesenvolvimento” foi proposto. Desde então, a ideia de desenvolver atividades econômicas de forma a preservar os recursos naturais e a biodiversidade tem se expandido, culminando na definição de “manejo sustentável” como a gestão de recursos naturais que visa atender às necessidades do presente sem comprometer as futuras gerações.

Existem no Brasil projetos de manejo florestal sustentáveis, uma abordagem de gestão das florestas que visa equilibrar as necessidades ambientais, sociais e econômicas para garantir que os benefícios das florestas sejam disponíveis tanto para as gerações atuais quanto futuras. Entende-se que os governos (municipal, estadual e federal), devem criar mecanismos para incentiva politicas que garantam a conservação da biodiversidade.  Trata-se de uma forma eficiente e de baixo custo, para mitigar as mudanças climáticas e ao mesmo tempo, criar condições para o desenvolvimento econômico das comunidades dependentes das florestas.

Na Amazônia, região com o maior bioma no Brasil, com suas espécies de árvores que absorvem a maior quantidade de CO2 na América do Sul, tem-se um caso do manejo sustentável da Palmeira de Açaí, muito comum na região.

Dados da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), indica que plantio de um hectare com Palmeira de Açaí, com espaçamento de 5 metros entre as plantas, consegue-se 400 palmeiras, ao custo de plantio equivalente a R$ 30 mil.

Uma analise do manejo sustentável através do conceito de ESG, sigla em inglês para Environmental, Social and Governance – em português, Ambiental, Social e Governança. ESG é um conjunto de critérios usado para avaliar o quão sustentável e responsável é uma empresa em relação a seu impacto no meio ambiente, na sociedade e na forma como é administrada.

(a) Environment “Ambiental” através da Captura de CO2

Considerando que 7 palmeiras absorvem 1 tonelada de CO2 em 20 anos, e 50 kg por ano. O plantio de 400 palmeiras absorve 2.9 toneladas de CO2. Durante 20 anos, um hectare de Palmeira tem potencial para absorver 57.1 toneladas de CO2.

O preço da tonelada de CO2 no mercado apresenta cotação entre US$ 5.00 e US$ 20.00, dependendo do mercado e do país. Para nosso exemplo, vamos considerar o preço de US$ 5.00, portanto, em um hectare com plantio de Palmeira de Açaí, obtêm-se receita de US$ 285,5 mil no ciclo de 20 anos ou US$ 15 mil/ano em valor nominal.

(b) Social: renda com a venda da poupa de açaí e madeira

  • Poupa de Açaí: Além da captura de CO2, a floresta de Palmeira produzira o fruto do açaí que pode ser comercializado no mercado e a madeira ao final do ciclo de 20 anos. Um hectare produz em média 12 toneladas/ano de polpa, ao preço R$ 60,00/kg, equivale a receita anual de R$ 720 mil. Durante 20 anos, considerando preço constante de R$60,00/Kg, pode obter renda de R$ 14.4 milhões.
  • Uso da Madeira: A madeira de açaí é leve, e pode ser utilizada em artesanato ou para construção de estruturas leves, ou mesmo para lenha. O preço da madeira de açaí para construção civil depende da região, forma de comercialização e demanda local. A madeira de açaí é considerada de baixo valor econômico. Na média, o preço do m³ é de R$ 30,00. Portanto, 400 palmeiras adultas com 0,5m3 cada, obtêm-se receita de R$ 6 mil.

(c) Governance: “Governança”

Uma boa governança no conceito de ESG, aumenta a confiança do mercado, reduz riscos e garante que a o projeto de manejo sustentável esteja comprometido com a sustentabilidade e responsabilidade social.

4.Conclusão

O Brasil emite anualmente em torno de 2,3 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa (CO2), de acordo com dados do IEMA – Instituto de Energia e Meio Ambiente. As emissões são causadas pelo desmatamento (55,0%), pecuária (25,0%,) automóveis, caminhões e outros veículos terrestres (10,0%) e outros setores (10%).

O investimento para neutralizar a emissão anual de CO2 no Brasil de 2,3 bilhões de toneladas, custa aproximadamente US$ 4,6 bilhões, ou 0,2% do PIB/24, valor menor que os gastos com o sistema de saúde e perda de produtividade de US$ 15,0 bilhões, ou 0,7% do PIB/24, (Tabela 1).

Organizações ou indivíduos, ao neutralizarem suas emissões, estão internalizando as externalidades, incorporando o custo social ao privado. O saldo de 0,5% (0,7% – 0,2%) do PIB poderia ser revertido na forma de incentivos para empresas ou indivíduos que neutralizarem suas emissões de gases.

Tabela 1

Nos cálculos, não foi considerado o custo da terra. Partimos da premissa que os projetos de manejo sustentável fariam uso de terra pública (união e/ou estados). Povos originários e ribeirinhos poderiam disponibilizar áreas degradadas, para empresas e/ou indivíduos neutralizarem suas emissões de gases através de uma Parceria Pública-Privada (PPP), coordenados por uma integradora sob supervisão do IBAMA (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente) e do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade).

A adoção de tecnologias limpas – ao invés daquelas intensivas em carbono – pode fazer com que o desenvolvimento econômico seja acompanhado de uma redução na degradação ambiental constante ou, até mesmo, decrescente. Contudo, o investimento na geração e adoção de tecnologias limpas não ocorre espontaneamente na quantidade necessária para desencadear a mudança estrutural ambientalmente requerida por conta da elevada incerteza inerente a esse tipo de investimento em atividades de natureza altamente experimental, a qual desestimula o “espírito animal do capitalismo”.

A solução para essa questão passa pela institucionalização de um mecanismo de interação entre os setores privado e público, além de um mix de política fiscal, industrial, comercial e regulatória que, não só induzam os agentes privados a internalizar os benefícios sociais e os custos de investimentos em tecnologias sustentáveis em suas atividades; como também permita ao Estado liderar, por intermédio de seus investimentos, a mudança estrutural ecológica naqueles setores e atividades nos quais a incerteza dificulte ou impossibilite o investimento privado.

Nesse contexto, o Estado tem o papel de prover informações para os demais agentes, identificando oportunidades de diversificação setorial da economia que contribuam para as metas de sustentabilidade ambiental, como as emissões de carbono. Também deve antecipar as tendências tecnológicas de longo prazo, fomentar a consolidação de mercados para novos produtos e prover os incentivos necessários para que a economia se beneficie da mudança estrutural em curso, possibilitando que surjam empresas nacionais pioneiras nos setores ambientalmente sustentáveis. Vale ressaltar que essas empresas podem adquirir vantagens competitivas à nível internacional, decorrentes do pioneirismo, ampliando seus mercados, dominando tecnologias de fronteira, aumentando a escala de produção e ditando novas tendências de mercado.

Gerar desenvolvimento econômico em bases ambientalmente sustentáveis não é uma tarefa simples, exige união e alinhamento de interesses entre os setores público, privado, sociedade organizada e universidades. Todos trabalhando juntos, para garantia a sustentabilidade do planeta para as gerações atuais e futuras. Nas palavras do filosofo alemão Immanuel Kant, “a vida pode ser mavavilhosa e também terrivel, e cada vez mais temos o poder de torna-la boa”.

Sobre os autores:

*Cláudio Gonçalves dos Santos é economista, mestre em administração financeira e contabilidade, MBA em finanças de empresas, Gestor de Valores Mobiliários com registro na CVM, Conselheiro de Administração, Professor Universitário em cursos de pós-graduação da FECAP/SP. Sócio da Planning, onde atua com Assessoria Financeira, Avaliação de Empresas (Valuation) e Wealth Management. e-mail: claudio@planningconsult.com.br

**Sergio Volk é economista, mestre em finanças e contabilidade, cursou doutorado em economia pela EPGE-FGV/RJ, especialista em gestão e avaliação de empresas. Foi Diretor Financeiro nas empresas: Revestimento Cerâmico CECRISA, Portinari (atual Dexco), DaGranja Agroindustrial (atual Seara), dentre outras. Foi Diretor de Câmbio e Assuntos Internacionais do BANESTES, além de Conselheiro Fiscal da Electrolux do Brasil S.A., Inepar Energia S.A. e TECFIL – Sofape Fabricante de Filtros S.A. Foi Presidente do IBEF Espírito Santo, Paraná e Araraquara; Conselheiro Fiscal do IBEF/SP e membro do Conselheiro Consultivo da Cogni ESG; foi professor na FAAP – Centro Universitário Armando Alvares Penteado, é professor em cursos de pós-graduação na FEI, SP. e-mail:volk@gerindodinheiro.com.br

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Esse artigo saiu na Revista Economistas. veja aqui

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